Alegria, tristeza, medo, raiva, carinho… Emoções e sentimentos são tão fortes e impactantes, e ao mesmo tempo, são invisíveis, impossíveis de tocar! Como aprender a traduzi-los em palavras?
Quando crianças, vivemos e sentimos intensamente. Num único dia, são diferentes sensações e sentimentos que se manifestam, decorrentes das mais diversas situações: da alegria de aprender algo novo à frustração de perder em uma brincadeira de bola.
Para que as crianças possam reconhecer, nomear e adquirir ferramentas para lidar com algo tão abstrato, como as emoções e os sentimentos, realizamos um trabalho bastante sensível e atento com elas, já na Educação Infantil.
“Mobilizar as crianças para que elas conquistem consciência sobre o que estão sentindo é colaborar para que elas construam sua subjetividade e sua identidade, para que saibam mais sobre elas mesmas. É um trabalho que acontece sempre com a mediação do adulto. Na medida em que os sentimentos vão sendo nomeados pelas professoras, as crianças passam a reconhecer quais sentimentos estão regendo as interações que têm com elas próprias, com as outras crianças, com os materiais e com o meio. Com o passar do tempo, elas mesmas conseguem nomear o que estão sentindo” – afirma Camila Maia, coordenadora da Educação Infantil da be.Living.
Camila explica que este trabalho é realizado com todos os grupos da Educação Infantil, com propostas diferentes, adequadas para cada faixa etária. “Para as crianças mais novas, o papel do adulto, que é quem vai nomear estes sentimentos, é de extrema importância. Quando acontece um momento de conflito, por exemplo, em que uma criança bate ou empurra, ou seja, quando ela está usando o corpo dela para comunicar alguma coisa, as professoras perguntam se ela pode estar brava ou triste, e por quais razões, sempre levantando hipóteses com o objetivo de favorecer que a criança vá percebendo o que ela de fato está sentindo. Este trabalho acontece o tempo todo, no dia a dia: na mediação das interações, nos conflitos e negociações, nas brincadeiras livres e, também, em momentos e projetos dedicados especificamente para trabalhar este tema.
Uma ferramenta utilizada para introduzir este assunto para os pequenos é o Mood Tracker. Em roda, as professoras apresentam para as crianças referências de sentimentos por meio de carinhas felizes, tristes, bravas, entre outras. Quando as professoras perguntam “How are you feeling today?”, as crianças podem escolher um daqueles sentimentos para traduzir como se sentem.
A literatura também é uma potente linguagem para aprender sobre algo tão abstrato como o emocional. Através das histórias, é possível entrar em contato com diferentes situações e pontos de vista, e perceber como cada personagem lida com sentimentos semelhantes aos que as crianças estão sentindo. Livros como “The color monster”, “I am peace” e “In my heart”, proporcionam reflexões que relacionam o conteúdo do livro com as experiências vividas pelas próprias crianças. Com isso, é possível desenvolver um olhar cuidadoso para o outro, cultivando a empatia e o diálogo.
A turma do Blue, integrada pelas crianças mais velhas, realizou um projeto especial sobre gentileza. Inspiradas no livro “Anita Bocadura”, de Mariângela Bueno, elas organizaram uma lojinha da gentileza. Esta foi uma forma de aprofundar a reflexão trazida pela leitura e, também, de compartilhar a aprendizagem com as outras crianças da escola. O grupo criou um móbile cheio de lembranças de gentileza que, além de enfeitar a sala, inspirou toda a comunidade escolar a praticar atitudes gentis no dia a dia. Na lojinha, crianças de outras turmas puderam escolher emojis, palavras e ações gentis, oferecendo, em troca, um gesto de gentileza. Este projeto criou momentos marcantes de afeto para todos na escola.
“Trabalhar os sentimentos é muito importante também para a construção de uma ação mais empática. No decorrer dos anos, conforme as crianças conseguem reconhecer, identificar e nomear por elas mesmas seus sentimentos, elas também conseguem olhar para o outro com um respeito maior. As professoras vão trazendo esse olhar. No primeiro momento é como se disséssemos: ‘olhe para o que você está sentindo’. Mais para frente, podemos dizer: ‘olhe para o que a sua ação causou’ ou ‘qual sentimento a sua ação gerou nesta outra pessoa’. Então, a criança começa a entender que se ela bate no amigo dela, ele fica bravo, dói no corpo dele, ele pode ficar frustrado e não querer mais brincar com ela. Assim como em uma situação de disputa de material, por exemplo, quando ela empresta o brinquedo para outra criança, ela percebe que o amigo fica feliz de brincar junto ou de brincar com aquele brinquedo”.
A coordenadora afirma que quando a criança conhece e nomeia os sentimentos, ela conquista maior consciência sobre quem ela é e como ela se coloca no mundo. “Quando ela está consciente sobre aquilo que ela está sentindo, ela tem a possibilidade de viver o momento presente, de olhar para o outro – dentro do que for possível para a sua faixa etária – com olhar mais empático, respeitando e valorizando, também, o que o outro está sentindo. De uma forma mais ampla, este tipo de trabalho colabora para uma construção social de boas relações e de respeito mútuo”.