A construção da identidade da criança na Educação Infantil

Quando as crianças de Yellow/Orange chegam na escola, pequeninas, entre 1 e 2 anos de idade, elas estão em uma etapa de desenvolvimento conhecida como fase egocêntrica. É um momento marcado pela autodescoberta, pela expressão “é meu” e pelo fato de elas acharem que o eu e o outro são a mesma coisa ou que os desejos delas são os mesmos que os desejos dos outros. Tudo isso faz parte de um processo natural e saudável do amadurecimento de toda criança e da formação de sua personalidade. 

É neste momento de suas vidas, também, que está um importante direito de aprendizagem que é “conhecer-se” e construir uma identidade pessoal, social e cultural que constitua uma imagem positiva de si e do outro.

Na experiência da educação, este aprendizado acontece por meio de vivências e explorações que contemplam linguagens, brincadeiras, cuidados e interações diversas que permitam que a criança se reconheça como um indivíduo, compreendendo que suas atitudes e ações repercutem no ambiente, o que é essencial para que ela se perceba como alguém diferente do outro.

A coordenadora pedagógica dos pequenos da be.Living, Camila Maia, explica que este trabalho de percepção da identidade acontece diariamente, permeando todas as trocas com as professoras e com as demais crianças. “A aprendizagem vai se dando no dia a dia, através das próprias mediações das professoras, para que a criança comece a perceber a diferença entre ela e o outro. Então, se tem duas crianças querendo brincar com o mesmo carrinho, por exemplo, a professora vai trazer falas como ‘Você quer uma coisa e tem outro ser que quer essa coisa, que tal brincarem juntos?’ ou ‘Você espera um pouquinho e daqui a pouco o outro te devolve’ e, assim, a professora vai mostrando que existe um outro na relação, que é diferente e que possui diferentes necessidades. A criança vai se reconhecendo como um ser com potências, desejos e necessidades próprias e o outro como um outro ser, com potências, desejos e necessidades diferentes. Isso tudo vai se dando muito no dia a dia, independentemente de qualquer projeto ou de qualquer trabalho de sequência didática”.

Camila explica que este processo de se reconhecer como um ser individual e único é muito importante pois possibilita que as crianças passem a construir uma percepção de protagonismo e autonomia, fortalecendo-se naquilo que elas já conseguem fazer sozinhas. “No Yellow/Orange, a gente trabalha com agrupamento, então, tem crianças da faixa etária de 1 a 2 anos junto com crianças de 2 a 3 anos. Na medida em que as crianças mais velhas reconhecem as suas potências, já numa percepção maior de suas identidades, elas se colocam no lugar de sabidas e passam a ensinar para os mais novos aquilo que elas já sabem. É um processo muito significativo porque é também uma forma de reforçar no cotidiano os conhecimentos, os saberes e as potências das crianças, na medida em que elas precisam saber muito sobre alguma coisa para que possam ensinar para o outro. Acreditamos que muito da aprendizagem acontece neste campo da troca entre os pares e com os professores, quando a criança se reconhece e se percebe pertencente a um grupo e quer contribuir com este grupo de alguma maneira. Tudo isso vai faz parte do projeto pedagógico da be.Living, que é trazer sempre a criança para o papel de protagonista em seu processo de aprendizagem”.

A coordenadora conta que, na prática, a construção da identidade vai acontecendo dentro do próprio mundo da criança. “A aprendizagem acontece nas situações de conflito, com o adulto apontando que tem um outro na relação ou quando a criança vivencia o processo de desfralde, por exemplo, que é uma grande conquista para ela, algo realmente muito marcante dentro do processo de trabalho com a identidade. As primeiras referências que as crianças têm para comparar e observar as diferenças são elas próprias e as famílias. Então, as professoras trabalham frequentemente com fotos das famílias para que as crianças percebam que há mães diferentes, pais diferentes, ou que há duas mães, por exemplo. A partir destas vivências que são próximas e mais fáceis de compreender, as crianças vão percebendo muitas diferenças, como cor de cabelo, cor de olho, preferências (o que mais gostam de brincar, o que mais gostam de comer), onde elas dormem em casa, se no berço ou na cama, quem usa fralda, quem faz xixi na privadinha, e isso vai sendo olhado não como conquista, no sentido de quem está melhor ou pior, mas como uma base de comparação para que sejam percebidas e respeitadas as diferenças e o momento de cada um, inclusive delas próprias”.

Uma etapa mais avançada deste processo de construção de identidade consiste em apresentar a diversidade para as crianças com referências diversificadas de culturas, raças e etnias. “Como estamos, de certa forma, em uma bolha, sendo a maior parte pertencente a uma mesma classe social, com as mesmas referências étnicas e as mesmas referências de experiências, é muito importante abrir a percepção da criança para o reconhecimento das diferenças entre os seres humanos, ao mesmo tempo em que se compreende, também, uma identificação de semelhança entre todas as pessoas, que transcende estas diferenças. As professoras vão trazendo essa questão da diversidade, dentro do próprio universo do ‘ser criança’, apresentando crianças em diferentes contextos, com brincadeiras da infância de diferentes culturas”.

Trabalhar a questão da construção da identidade no ensino à distância tem sido desafiador segundo Camila, principalmente porque os grupos de YO foram consideravelmente reduzidos e não são todas as crianças que participam das lives. “Este fato acabou restringindo as possibilidades de comparação entre as crianças, mas temos feito trabalhos e vivências que têm sido enriquecedores e estão fazendo sentido neste momento. Abrimos mão de recursos complementares que usaríamos no presencial, como vídeos e imagens, pois as crianças já estão muito tempo diante das telas, e estamos mais focadas nas conquistas do dia a dia. Há muitas crianças despertando para o processo de desfralde, que é um marco super importante, e há crianças que estão conseguindo fazer coisas novas sozinhas. Então, as professoras estão trazendo um pouco destas aprendizagens para as lives e construindo a identidade a partir do que está acontecendo neste momento da criança e também de sua família. Os pais mandaram fotos para as professoras, e elas contaram histórias da família a partir deste material. Também fizemos uma evolução com fotos das crianças, desde quando elas eram bebês, mostrando como elas já foram diferentes um dia, marcando este crescimento. É desafiador estar a distância, mas tem sido possível fazer um trabalho muito significativo”.

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