Um dos grandes pilares da be.Living é o protagonismo. Aqui, desde que entram na escola, pequenininhas, até o momento em que encerram o ciclo no 5º. ano do Ensino Fundamental, as crianças são vistas como seres autônomos em desenvolvimento, curiosas e potentes em seus processos de aprendizagem, capazes de lançar perguntas significativas sobre si e sobre o mundo. A pandemia, no entanto, lançou-nos um grande desafio: “Como seguir promovendo a autonomia e o protagonismo das crianças quando estamos distantes, no ambiente virtual?”
A coordenadora do Ensino Fundamental, Gabriela Fernandes, conta que sua grande preocupação foi com as crianças menores, de 1º., 2º. e 3º. anos. “As crianças do 4º. e do 5º. conseguem e têm conseguido com bastante competência exercer a autonomia e o protagonismo no ambiente virtual. As menores estão num outro momento. Crianças desta faixa etária, mesmo em sala de aula, estão trabalhando sempre com alguém: ou com os iguais, que são os colegas, ou com as professoras, que estão sempre em sala rodando entre uma mesa e outra, acompanhando de perto a aprendizagem. Então, foi um baita desafio a gente pensar em formas destes meninos começarem a colocar a mão na massa sozinhos, do jeitinho deles. Ficamos numa busca muito grande de ferramentas que favorecessem isso. O Google Classroom foi uma que a gente achou muito fácil de operar, que eles poderiam mexer com o mínimo de autonomia. E pensando nos menores do 1º. ano, a gente descobriu uma ferramenta chamada Flipgrid, que ajudou muito a trazer esta autonomia para eles”.
Gabi conta que a experiência foi revelando habilidades das crianças que, até então, passavam despercebidas. “A gente começou a perceber que essas crianças têm um repertório bem grande de Youtube, de internet, de escrita, porque a maioria tem tablet, joga. Então, começamos a pensar em propostas e situações nas quais elas pudessem utilizar estas ferramentas que tanto gostam e que normalmente usam para diversão, e começar a usá-las para a escola. Em alguns casos, mudamos o currículo mesmo. As professoras começaram a trabalhar com telejornal, contação de histórias, saíram do processo de escrita e foram para o processo de reconto. Eles começaram a recontar usando fantoche e elementos da casa. Estamos testemunhando o 4º. e 5º. anos fazendo um grande trabalho autônomo, ao ponto das próprias crianças do 5º. conduzirem a Reunião de Pais por meio do Loom. O que se apresentou, primeiramente, como um problema, foi sendo percebido de outro modo por nós ao longo do processo, porque fomos descobrindo que eles já tinham um rico repertório. Começamos a propor algumas situações que na escola nem pensaríamos em propor e estamos nos surpreendendo com a potência que eles estão revelando”.
A professora do Year 3, Fabiola Godoy também concorda que todo este processo, desde o início, tem sido positivamente surpreendente. “Se nos perguntassem aonde estaríamos em 2020, acho que nenhum de nós se imaginaria tendo que ficar em casa, de quarentena, devido à uma pandemia. Este fato nos pegou de surpresa e de maneira muito rápida. No início, tivemos muito receio: Como isto vai funcionar? Mas conforme fomos colocando as mãos na massa, tudo passou a fluir. Claro que nada de maneira simples e fácil, mas com o apoio das outras educadoras e das famílias, fomos caminhando e começando a chegar a algum lugar. Algumas crianças que inicialmente mal utilizavam um computador, hoje estão mexendo com destreza. Outras que demonstravam timidez em frente à câmera, hoje passam a utilizá-la como aliada, afinal, a saudade dos colegas de sala e dos professores fala mais alto e poder enxergar uns aos outros, ainda que pela câmera, passou a ser mais importante do que se esconder dela. Aqueles que precisavam de auxílio para desligar o áudio enquanto outro colega se colocava, hoje o fazem sem ao menos serem solicitados ou fazem isso entre eles mesmos dizendo “Fulano, desliga seu áudio pois estou ouvindo conversa aí” e por aí vai. Tudo isso é conquista de autonomia”.
Para deixar o ambiente virtual mais animado, atividades de leitura compartilhada, artes e jogos passaram a acontecer pelo menos uma vez por semana, criando uma atmosfera leve de brincadeira, despertando estímulo, curiosidade e encorajamento mútuo. “No Year 3, temos alguns projetos de maior sucesso que pretendemos utilizar até o final deste ano. O portfólio virtual é um dos principais. Junto das educadoras, individualmente, as crianças escolhem as atividades mais significativas para elas e criam a pasta virtual para que possam acessar quando quiserem e compartilhar com amigos e familiares. O Bingo, o jogo de forca, o jogo de memória e o Kahoot são jogos por meio dos quais conseguimos consolidar linguagem e vocabulário de maneira bem divertida, e as crianças amam. Para algumas atividades, pedimos que elas nos enviassem vídeos ou áudios recontando histórias ou fazendo um telejornal, e que surpresa foi ver a criatividade de cada uma delas! Temos um projeto grande no Year 3 chamado “Modos de vida em diferentes tempos” em que as crianças exploram os povos indígenas na Língua Portuguesa e a Grécia Antiga na Língua Inglesa. Para este projeto, estamos criando um website com os meninos e as meninas onde serão incluídos textos, fotos, biografias e vídeos trabalhados durante todo o ano, e a ideia é compartilhar o conteúdo com a comunidade escolar. Do nosso ponto de vista, encorajar as crianças neste momento, deixando claro que em tão pouco tempo elas atingiram tantos objetivos é o mais importante”.
A professora Michele Ristow, também do Year 3, diz que foi fundamental reforçar para famílias e crianças que o processo de ensino-aprendizagem, que inclui o protagonismo e o desenvolvimento da autonomia, não se encerraria em função do distanciamento e do ambiente virtual. “É necessário, principalmente, validar com a criança e estimular nela a questão da própria autoconfiança, e compreender que qualquer questão envolvida com erros ou atrasos na entrega de atividades são fases de um caminho que está sendo desenhado, que não é um caminho posto, mas um caminho em construção, em que todos estão aprendendo: professores, famílias e crianças. Promover estes diálogos com a família foi uma das coisas mais importantes para enfrentar esses desafios e para que eles possam ser, a cada dia, melhores vistos, a fim de que a criança tome as suas decisões respeitando os direitos e deveres, como escola e como combinados que a gente tem”.
Michele lembra que as crianças entraram em contato com emoções muito fortes na quarentena e que as questões emocionais interferem no processo de aprendizagem dos pequenos. “Estas questões podem tanto barrar e prejudicar todo um percurso de uma criança que já estava indo muito bem como, no lado oposto, oportunizar avanços de certos comportamentos e modos de ser em sala de aula que podem se modificar no ensino a distância. É importante nós validarmos o que essas crianças estão fazendo a distância e ouvi-los. Acredito que a escuta atenta e ativa é o caminho para que a gente possa validar essa construção que estamos realizando pouco a pouco, juntos, a fim de potencializá-los no sentido de que eles confiem e entendam que são capazes e essa autonomia vai, então, sendo construída conforme se fortalece o sentimento de confiança”.
Alguns trabalhos têm evidenciado que o protagonismo é uma realidade no processo de ensino-aprendizagem a distância. Autoconfiança, autonomia e potência criativa foram atributos que possibilitaram ao Year 3 produzir um videoclipe musical, sob a orientação da professora de música Amanda Ribeiro. “Por ocasião da Festa Junina, estávamos em contato com um côco, praticando o canto e o ritmo, fazendo os livros de pandeiros. Espontaneamente, eles começaram a me mandar vários vídeos deles tocando o côco com seus ‘pandeilivros’ e percebi que eles estavam muito craques naquilo. Daí veio a inspiração de fazer um videoclipe da gente cantando, a distância. As crianças arrasaram, gravaram cada uma um trecho da música, super lindas e afinadas, e eu estou super orgulhosas delas e do nosso primeiro vídeoclipe! A ideia é fazer com as outras turmas também!”.